Oportunismo de mercado
Um dos cartazes da manifestação “integração sem posse”, na capital paulista.
- “Oportunista, aproveitou a bobeira da zaga adversária e fez o gol”. Essa frase poderia ter sido pronunciada por qualquer locutor esportivo narrando um jogo de futebol. Nela, o sentido da palavra oportunista mostra a qualidade de um jogador capaz de tirar proveito da desatenção alheia e acertar a meta. De fato, uma das acepções dessa palavra está na “habilidade em tirar partido de circunstâncias ou fatos para a obtenção de algo”, como nos ensina o dicionário.
Uma busca pela internet e a palavra oportunismo, ou, oportunista, aparece em mais de 10 páginas. E fala, geralmente, sobre política e ou políticos. A mais densa e, talvez, que origina os outros discursos, talvez seja a do revolucionário russo W. I. Lênin, que, em 1916, escreve um artigo criticando antigos companheiros que tinham abdicado à luta de classes, ainda que a defendessem, em teoria. De lá para cá, a sede dos revolucionários das causas operárias cada vez mais encontra alívio nas coligações e composições com as estruturas e partidos da burguesia. E o oportunista traidor da causa social se torna uma espécie de jogador de futebol que pode chegar até à presidência.
Mas não só em futebol e política partidária que isso acontece, a palavra oportunista vem acompanhada de uma aura de malandragem que parece até designar-lhe certo charme, o contrário do otário, outro representante do imaginário que se construiu sobre a figura típica do brasileiro.
Para quem quiser saber os exemplos de como funciona essa engrenagem no Brasil, não pode deixar de ver o filme “Quanto vale Ou é por quilo?”, do diretor Sergio Bianchi. Na película, o diretor faz uma análise das ongs e das empresas que faturam sobre a miséria no país, traçando um paralelo com a negociação de humanos, na época da escravidão. Em um dos trechos do filme, duas senhoras, representantes de entidades filantrópicas, brigam pelos mendigos que encontram na rua, cada qual interessada em “assisti-los”, a troco de manterem suas instituições recebendo verbas. E é nessa toada que o filme passa por questões como a de empresas poluentes, ou escravagistas, mas com selo de “responsabilidade social” em suas logomarcas.
Esse olhar “oportunista” está tão impregnado em cada um de nós, que seria o caso de perguntarmos, também, até que ponto nossa desconfiança sobre tudo e sobre todos, não é, ela mesma, oportunista? O próprio filme citado está nesse fio de lâmina: não seria um oportunismo falar dos oportunistas? E o que poderia ser revolucionário – ou o contrário de oportunista – em um momento que o conceito de luta de classes parece imerso nas mãos de tantos “oportunistas”?
Em São Paulo, o governo municipal e estadual tentou retirar mais de 400 famílias de um prédio ocupado, na rua Prestes Maia. Coletivos de artistas têm se mobilizado para, junto àquelas pessoas, constituírem resistência até mesmo à força policial que reprime cada manifestação à base de cacetetes. O antigo proprietário do edifício deve mais de 5 milhões de impostos. Assim mesmo o poder público não quer vê-los no centro da cidade. Lugar de pobre, na concepção desses políticos, é a periferia. Quando muito. Mas nem tudo está perdido! Uma liminar do governo federal adiou a reintegração de posse ao antigo dono. E os artistas estavam lá, mais uma vez, como em outra vez tiveram, agora, também para comemorar. Assim como estão juntos em outras ocupações na capital. Resistindo com os menos possuídos. Aos que os chamam de oportunistas, por pegarem carona nos movimentos sociais, os artistas, simplesmente respondem com seus trabalhos, onde arte e atitude política caminham de mãos dadas. Quem quiser, pode acessar o site http://integracaosemposse.zip.net/ , da internet, que eu – “oportunisticamente” – busquei para escrever um texto sobre “oportunismo”.
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