quarta-feira, setembro 20, 2006

Arte da política, política da arte




















“Oba, a manteiga acabou!”, de 1935. Fotomontagem de John Heartfield ironizando a propaganda nazista, do ministro Goering, em um discurso em Hamburgo: "Ferro sempre tornou impérios fortes, manteiga e toucinho têm no máximo tornado as pessoas gordas.”



"Um político divide os seres humanos em duas classes: instrumentos e inimigos."
F. Nietszche

Arte da política
A relação que une arte e política é menos estranha do que poderia parecer. Arte e política sempre tiveram uma relação imbricada, mesmo que a arte da política e a política da arte não caminhassem em direções simultâneas.
Mas não essa arte da política que cria monstrinhos que aparecem na tela da televisão em épocas de eleição. Aliás, o que se vê de menos, nessas épocas, é política como arte. A não ser que consideremos os candidatos atores, e seus agentes publicitários vendedores de embalagens, onde a maquilagem e a interpretação é o que valem para arrebatar votos. Embora sejam muitos os candidatos disputando cargos, sabemos que poucos deles estão interessados, de fato, nas possibilidades de inclusão social, em ativar mecanismos para a proteção ambiental, em se sacrificar por uma mudança de hábitos viciados da prática governamental e uso de seriedade e transparência de comportamento diante da máquina administrativa. Refazer esses hábitos seculares é lutar contra a próprio poder constituído em nosso país, como nação explorada. Mesmo que existam candidatos dispostos a mudar esse quadro, se eleitos serão obrigados a negociar e a jogar conforme quer o capital, sob o risco de terem seus mandatos engessados. E isso até o mais extremista deles sabe quando se dispõe a participar do mercado eleitoral.

A arte da política é quando, realmente, se consegue chegar a comuns acordos em benefício da coletividade. Quando se consegue o entendimento sobre determinado ponto de vista e partilha-se dele. Quando se chega à prática visando o bem comum e de acordo com as pessoas interessadas. Quando se consegue gerenciar conflitos através do debate aberto e sincero. E não o pseudo-debate, como em um jogo de cartas previamente marcadas. Quando a hierarquia entre a base eleitoral e governo é minimizada, senão abolida, na disputa dos vários interesses que movem o poder. Como diz o ditado: melhor morar em uma casa de sapé sabendo do que está acontecendo, do que em um palacete no meio do desentendimento.

Política da arte
Já a política da arte, essa flutua no emaranhado de uma trama que depende tanto da visão dos agentes que estão no poder político – se pensarmos arte como conjunto de valores simbólicos produzidos dentro de uma comunidade – quanto da capacidade de organização dos próprios produtores culturais para atingir objetivos específicos, que dizem respeito à cultura na qual essa arte é produzida.
Por exemplo, nem sempre os interesses dos artistas são levados em consideração na hora da distribuição das verbas públicas para a arte e para a cultura. Mesmo disfarçado de representação democrática, com leis regularizando a aplicação de verbas, não estamos imunes ao “assistencialismo cultural” disfarçado de obras sociais. Até porque a cultura não se resume à arte. E os recursos – divididos com a educação, com o esporte, com a saúde e até com obras públicas, em vários casos – diluem-se.
Mas fazer política de arte é também forçar nossos representantes a enxergarem o valor desses "produtos simbólicos" para além de suas concepções "sociológicas", ou de suas visões sobre arte "moderna". Porque a criação artística antecede ao discurso e à própria política pública que irá gerenciar a arte. Porque fazer arte não é produzir o que se espera – seja por quem for – o que seja arte. A produção da arte se dá antes como visão de mundo e não como ação que prevê um determinado sucesso de público, ou de crítica, ou de acomodamento em uma base ideológica, ou político-partidária. E uma arte que não seja subversiva e crítica, desde a própria formulação; uma arte cuja inquietação não seja o fermento de sua origem e; uma arte que não esteja fundida à própria terra onde deveria ser parida, só se torna um instrumento nas mãos de quem agora as estende, pedindo seu voto, (e)leitor.